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  Kimbanda significa algo como “curandeiro” em kimbundu, um idioma bantu falado em Angola.  
O kimbanda é uma espécie de xamã africano.  
O ofício do kimbanda é chamado de “umbanda”... Todos já ouvimos essa palavra por aqui.  
   
Quimbanda é um culto afro-brasileiro com forte influência bantu e muito influenciado pela magia negra européia.  
   
Kimbanda e Quimbanda se confundem, mas são cultos distintos e com objetivos diferentes.  
   
O kimbandeiro é um membro ativo de sua comunidade,  
um doutor dos pobres e intérprete dos espíritos da Natureza.  
Ético, ele sempre trabalha para o bem, a paz e a harmonia.  
   
O quimbandeiro é um feiticeiro.  
Normalmente vive afastado, não se envolve socialmente.  
Na África, o kimbandeiro faz a ponte entre os Makungu (ancestrais divinizados),  
os Minkizes (espíritos sagrados da Natureza) e os seres humanos.  
   
Ele entra em transe profundo, incorpora os seres invisíveis que consultam os necessitados e os aconselham na resolução dos problemas. Os espíritos no corpo do kimbanda falam, fumam e bebem.  
   
Como autêntico xamã, ele sabe que a mata é um ser vivo que respira, come e sente.  
Ela é densamente habitada por diversos tipos de entidades, que transmitem seu conhecimento aos sacerdotes eleitos.  
Alguns destes seres se parecem a “duendes”.  
Eles tem uma perna só, um olhos só ou falta algum braço.  
Moram dentro da mata e podem cruzar o caminho de algum caçador.  
Um Ponto Cantado para os exus na Umbanda, diz:  
   
“Eu fui no mato,  
oh ganga!  
Cortar cipó,  
oh ganga!  
Eu vi um bicho,  
oh ganga!  
De um olho só,  
oh ganga!”  
   
Ganga vem de Nganga, um dos nomes pelo qual o kimbanda é conhecido.  
   
Nosso querido Saci Pererê é um deles.  
   
Ele usa o filá (gorro) vermelho dos kimbandas, o cachimbo dos pretos velhos e o tabaco dos caboclos!  
   
O quimbandeiro centra seu trabalho na figura de Exu, que é um Orixá yoruba e não um Nkizi bantu.  
   
A entidade que se assemelha a Exu entre os bantu é chamada de  
Aluvaiá, Nkuvu-Unana, Jini, Chiruwi, Mangabagabana e Kitunusi dependendo do dialeto e da região.  
   
Aluvaiá pode ser “homem” ou “mulher” e sua energia permeia tudo e todas as coisas.  
Ele se adapta muito bem à noção umbandista de exu (entidade masculina) e pomba gira (entidade masculina).  
   
O quimbandeiro também invoca e incorpora as entidades associadas ao culto do magnífico Orixá Exu, os exus e pombas giras.  
Pode haver sincretismo com nomes como Lúcifer, Asmodeus, Behemoth, Belzebu e Astaroth da Cultura Européia.  
   
A visão das entidades também pode mudar... O kimbandeiro invoca as almas dos antigos  
Tatas (pais espirituais ou sacerdotes curandeiros) e Yayas (mães espirituais ou sacerdotisas curandeiras).  
   
Estas almas transcenderam o limite da materialidade e da ignorância.  
Elas possuem bondade, conhecimento e luminosidade.  
Algumas não precisam mais encarnar, pois, já evoluíram o suficiente neste mundo.  
   
O quimbandeiro invoca almas de entidades que em vida foram feiticeiros, malandros, mercadores, homens ou mulheres comuns, etc...  
Na África o sangue é um elemento sacrificial.  
O kimbandeiro oferece um animal a uma entidade, prepara a carne e entrega a primeira porção ao espírito.  
O resto do animal, que se tornou agora alimento, é compartilhado com a comunidade se isto acontece em data festiva.  
   
O quimbandeiro, não está interessado em “sacrificar” (tornar sagrado), ele está preocupado com os poderes mágicos do sangue, vísceras e couro do animal. Portanto, teologicamente falando, ele não sacrifica.  
   
As imagens utilizadas no culto do kimbandeiro são feitas de pedra, madeira e barro.  
Os artesãos procuram modelar as entidades da Natureza de forma natural e simples.  
A imagem é consagrada cerimonialmente e uma porção do espírito da entidade passa a habitar a efígie.  
   
Na Quimbanda, na maioria das vezes, são utilizadas imagens de gesso que representam os espíritos aliados.  
Comumente estas imagens tem aspecto avermelhado, podendo ter chifres ou não.  
   
O kimbandeiro é um agente social.  
Ele depende da comunidade e a comunidade depende dele.  
Quando aceita um pagamento para seu trabalho, ele retira do mesmo a sua sustentabilidade.  
Todo mundo sabe e pactua com isso.  
Não existe abuso.  
Trocas de mercadorias e favores podem substituir o dinheiro como pagamento.  
As pessoas empobrecidas são atendidas sem nada precisar dar em troca.  
   
As vestes do xamã bantu são normais e naturais.  
Quando está trabalhando usa filá, guias de sementes, cinturão com amuletos e roupas sóbrias.  
Três são os pilares do kimbandeiro: amor, honra e caridade.  
   
O universo da Kimbanda é composto por tês mundos que se interpenetram:  
o mundo celeste onde moram os espíritos celestiais e originais (alguns Minkizis e ancestrais divinizados),  
o mundo natural habitado pelos homens e pelos espíritos da natureza (elementais)  
e o mundo subterrâneo da morte e dos ancestrais.  
   
O médium na Kimbanda é um canal entre os espíritos e os que precisam dos espíritos.  
Ele é um instrumento mágico, um servidor da humanidade que pratica um transe profundo,  
pois, somente adormecendo o ego o divino pode fluir.  
   
Os espíritos utilizam o médium com gentileza e cuidado, sem esgotar suas reservas de energia psíquica.  
   
A Umbanda, certamente, bebeu das águas tradicionais da Kimbanda.  
   
Os negros bantus trouxeram sua herança espiritual, legítima, luminosa, ecológica e antiqüíssima.   
Oramos para que as antigas almas dos Tatas e Yayas nos ajudem a separar o trigo do joio.  
   
Nzambi primeiro!  
   
Nsala Malekun!